sexta-feira, 5 de junho de 2015

O sofrimento é passageiro; a conquista: será eterna!


Na resenha de hoje, trago a narrativa feita pelo amigo Eduardo Rodrigues, sobre sua participação na Comrades Marathon 2015. Sou suspeito em comentar o relato, todavia, penso que a leitura será muito maior do que uma narrativa de corrida, pois ela lhe proporcionará algo melhor: - A magia do poder de superação do ser humano.

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No último domingo, 31 de maio de 2015, pela quinta oportunidade, participei da ultramaratona Comrades, prova que acontece anualmente entre as cidades de Durban e Pietermaritzburg, na África do Sul, com distância que varia entre 87,8 km (up run) e 89,3 km (down run).
Big Five
Desta feita, estive na companhia de 4 amigos e mais a esposa de um deles. Sendo eles Wilson Bomfim, na sua décima participação, Samuel Toledo na sexta participação, Dionísio Silvestre na sua quarta participação; que viajou acompanhado da esposa Marileusa, e o Sergio Carvalho, estreante na aventura.


Apesar do tempo decorrido e da diferença de 5 horas no fuso horário, a viagem até Durban foi muito tranquila. Chegamos por lá na quinta-feira, próximo do horário do almoço local, ou seja, com tempo suficiente para descanso e aclimatação ao fuso.
No café da manhã em Durban
Como das demais participações, eu estava me sentindo bem preparado para o desafio, até por que, nossos treinos incluíram altimetria muito próxima da que iríamos enfrentar na Comrades deste ano, com predominância de subidas.
durante os treinos
No dia da corrida, às 5 h já estávamos perfilados, aguardando o tiro do canhão, que autoriza a largada, pontualmente às 5:30h. Largamos juntos na baia "C", eu, Samuel e o Silvestre. Embora a multidão fosse maior do que 22 mil corredores na largada, rapidamente estávamos no ritmo planejado, entre 05:30 e 06:00 minutos por km.

Com o dia amanhecendo, fui mantendo minha corrida com a expectativa de concluir a prova abaixo de 9 horas. Tudo ocorria dentro do planejado, até que, entre os km 40 e 45, comecei a sentir incomodo no ciático da perna esquerda.

Um pouco mais adiante, no km 56 - parei em um dos 80 postos de hidratação e pedi uma massagem. Com a manipulação do músculo e do tendão, ocorreu uma contratura no posterior da coxa e assim, não conseguia correr.

Sem muitas alternativas, parei, sentei, alonguei e cautelosamente, tentei voltar a correr, mas aquilo não era possível. Naquele instante, faltavam 32 km para cruzar a linha de chegada. Em uma fração de segundos, calculei que teria um pouco mais de 6 horas para concluir a prova dentro do tempo limite de 12 horas.

Em nova oportunidade, comecei a andar com muita dificuldade, empurrando a perna com a mão. Embora soubesse que teria muito tempo para completar a corrida, um turbilhão de pensamentos habitavam minha cabeça, todavia, estava convicto que seria muito desgastante prosseguir na prova. Foi quando tomei a decisão de abandoná-la.

Com aquela limitação, continuei caminhando lentamente e logo a seguir, o amigo Silvestre me ultrapassou e embora tenha insistido para eu acompanhá-lo, não tinha condições sequer de andar direito, muito menos correr.

Por ironia do destino, aguardei eventual aproximação de um carro da organização para desistir e consequentemente, ser transportado para o ponto final da corrida, todavia, não apareceu nenhum e assim, continuei caminhando por uns 4 km. Naquele estágio da prova, penso eu que no Km 60, as dores ainda martelavam com muita intensidade, porém, sem me dar conta, eu havia me adaptado ao sofrimento.

Sem muitas delongas, comecei a trotar, estilo "deixa que eu chuto" - arrastando a perna esquerda, ou seja, muito lento. À guisa de ilustração, meu pace que era entre 05:30 e 06:00 por km, passou a ser entre 8 e 9 minutos. Literalmente, eu estava saindo do fundo do poço e aquela nova situação, embora contraditória, deu-me a certeza que completaria a corrida no prazo das 12 horas.

Alguns quilômetros à frente, foi a vez de outro amigo me ultrapassar, neste caso o Samuel. Ocorreu que ele também tinha suas limitações orgânicas, pois estava com problemas estomacais.

Quando faltavam cerca de 17 km - o quadro que já era complexo, tornou-se ainda mais complicado: - tropecei em alguma coisa na pista e fui beijar o asfalto. A Sequela: uma escoriação no cotovelo esquerdo.

Quando completei a última grande subida - a temida Polly Shortts - fui ultrapassado pelo estreante Sérgio Carvalho. Naquele ponto faltavam aproximadamente 8 km, foi quando tive a certeza da conclusão da prova em tempo inferior a 11 horas.

Sob muita luta, perseverança e firmeza de propósito - às 15 horas 22 minutos 47 segundos, cruzei a linha de chegada, com o tempo de 10 horas e 22 minutos.

Sem sombra de dúvidas, essa foi a minha prova mais difícil, ao mesmo tempo, a mais gratificante, porque pude, na aflição das dificuldades enfrentadas, conhecer o lado mais perverso do sofrimento e a capacidade de superação.

Apesar de tudo, dou graças pelo não aparecimento do carro da organização, que sobrestou minha desistência, porque, com certeza, hoje, estaria arrependido.

Por outro lado, quero agradecer aos amigos de Brasília pela força nos treinamentos e, em especial, durante a prova. E aos demais corredores que, diante das minhas dificuldades, tinham sempre palavras de apoio e incentivo.

Para encerrar, não digo que não voltarei a correr a Comrades porque uma decisão agora seria emotiva. Vou dar tempo ao tempo, curar a lesão e, então, me posicionar.

Quem sabe a gente sara dessa doença de correr ultramaratona?


Eduardo Rodrigues

3 comentários:

  1. Grande Dudu,

    Ficou maravilhoso o relato, sei que foi uma corrida de total superação, a gratificação de terminar uma prova com tamanha adversidade é superior a concluí-la dentro da meta planejada.

    Parabéns!

    Aquele abraço,

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  2. Grande Dudu,

    Não me canso em retornar à postagem para lê-la novamente, pois a sua narrativa nos dá a dimensão do quanto difícil a prova se tornou. Parabéns em mais uma oportunidade, a meu perceber, a conclusão da prova vai além do poder de superação e firmeza de propósito.

    Forte abraço,

    Silvestre

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  3. Eduardo! Você provou que nossos limites somos nós que fazemos, no ano que vem, que será minha última Comrades, espero te ver lá novamente, batendo seu recorde. Parabéns meu amigo!
    Um forte abraço

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Aos leitores do blog "Correr é Pura Paixão" deixo meu profundo agradecimento. Aguardo seu comentário, uma vez que a participação de vocês é de grande importância para o aprimoramento dos relatos.

Ultra abraço,

Dionisio Silvestre